A Câmara de Lisboa assume na quarta-feira a gestão da rodoviária Carris, 41 anos depois de a "ter perdido" para o Estado, num processo envolto em polémica, depois de o PCP ter pedido a sua apreciação parlamentar.
"A Carris regressa a casa", afirmou o presidente da câmara lisboeta, Fernando Medina (PS), na cerimónia de assinatura do memorando da passagem de gestão da rodoviária para o município.
A opção do Governo de entregar a empresa à autarquia surge na sequência da suspensão dos processos de concessão das empresas públicas de transporte, lançados em 2011 pelo Governo PSD/CDS-PP, liderado por Pedro Passos Coelho.
Na ocasião, o então primeiro-ministro ainda atribuiu à espanhola Avanza a exploração da Carris e do Metro de Lisboa; à britânica National Express, que detém a espanhola Alsa, a STCP - Sociedade de Transportes Coletivos do Porto; e à francesa Transdev o Metro do Porto.
No entanto, nove dias depois de ter entrado em funções (em novembro de 2015), o executivo de António Costa (PS) suspendeu o processo "com efeitos imediatos".
Defendendo que os transportes terrestres devem ser geridos pelos municípios, porque são estes que gerem as estradas, o estacionamento, os semáforos e as faixas BUS, entre outros, António Costa decidiu cumprir uma ambição antiga e entregou a Carris à Câmara de Lisboa.
A cerimónia oficial realizou-se a 21 de novembro e a autarquia vai começar a gerir a rodoviária a partir de 01 de fevereiro de 2017. Contudo, a 25 de janeiro, o PCP entregou na Assembleia da República um pedido de apreciação parlamentar do diploma que transfere a Carris para o município.
Mais tarde, o comunista João Frazão esclareceu que o partido ainda não tinha decidido se vai apresentar propostas de alteração ou avançar para a eliminação do diploma do Governo socialista. Nos próximos dias, os comunistas vão receber órgãos representativos dos trabalhadores.
Na resposta à decisão do PCP, Fernando Medina disse que este é "só um debate, um diálogo", que será travado com confiança e convergência entre parceiros.
Depois de assumir a gestão da empresa, o autarca socialista terá de pedir o parecer vinculativo da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes sempre que fizer alguma alteração ao contrato que existe atualmente com a Carris. Contudo, este parecer não é exigido para a passagem da rodoviária para a autarquia.
O autarca já fez saber que nos próximos três anos vai adquirir 250 novos autocarros para a cidade, fazer um investimento de 60 milhões de euros, contratar 220 motoristas, criar 21 novas linhas, atribuir passes gratuitos a todas as crianças até aos 12 anos e descontos para os idosos.
A Lusa pediu uma entrevista ao presidente da Câmara de Lisboa sobre a passagem da gestão da Carris para a autarquia, mas Fernando Medina não se mostrou disponível.
Em setembro, o presidente da Câmara de Loures, concelho abrangido pelo serviço da Carris, criticou a entrega de transportes públicos à capital.
Bernardino Soares (PCP), que esta semana também se escusou a dar uma entrevista sobre o processo, defendeu então que a rodoviária e o Metro de Lisboa deveriam ficar sob alçada de uma entidade supramunicipal pública.
Este mês, a Câmara de Lisboa aprovou a constituição do conselho de administração da Carris, reconduzindo Tiago Farias como presidente e Realinho de Matos e António Pires como vogais.
Apesar de o município assumir a gestão do serviço, a dívida da empresa mantém-se no Estado.
"O Estado não faz nenhum favor, porque se mantém responsável pelo que já é responsável, que é a dívida que criou", afirmou em novembro o primeiro-ministro, António Costa, acrescentando que o valor, em 2015, ascendia a cerca de 700 milhões de euros.