Documentário sobre a 'artista gigante' Paula Rego estará pronto daqui a um ano

O realizador Nick Willing, filho de Paula Rego, descobriu "muitos segredos" durante as entrevistas que fez à mãe, uma "artista gigante", cujas memórias "difíceis e fascinantes" pretende colocar num documentário, que deverá ser estreado daqui a um ano.
 
O realizador falava aos jornalistas no intervalo da conferência internacional dedicada ao estudo do imaginário da pintora, que teve início hoje, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, e termina na sexta-feira.
 
"A minha mãe teve sempre muitos segredos e era bastante fechada. Mas agora tem 80 anos e não se importa com o que pensem dela. Sente-se mais livre para falar", disse o realizador, em português, acrescentando que muitos dos segredos são "chocantes e perigosos".
 
Realizador de ficção dramática, Nick Willing, 54 anos, é filho de Paula Rego e do pintor Victor Willing (1928-1988), tendo assinado filmes como "O Caçador de Segredos" (1997) e "Alice" (2009), e também séries como "Olympus" (2015).
 
A ideia de fazer um documentário sobre Paula Rego surgiu a Willing nos anos 1970, quando começou a filmar a mãe com a máquina do avô, na Ericeira, onde a família viveu.
 
Nick veio para Portugal com apenas seis meses e regressou a Londres com a família aos 12 anos.
 
"Ela pintou-me várias vezes, e agora é a minha vez de a retratar", justificou, comentando ser a primeira vez que faz um documentário, sobre "uma realidade e não uma ficção", e também sobre "uma artista gigante", que é a mãe.
 
Para o realizador, "é também uma aventura". Preocupa-se que seja feito com qualidade e ainda irá decidir o que revelar dos segredos da mãe, que terá de consultar.
 
Também fará entrevistas a outras pessoas próximas, incluindo família e amigos.
 
Além do material que registou nos anos 1970 e 1980, descobriu um enorme arquivo de filmes e fotografias, guardado pelo avô materno, numa "gaveta secreta", na antiga casa da família no Estoril.
 
Para filmar a mãe, Nick colocou três câmaras no ateliê, em Londres, e ia falando livremente com ela. Paula Rego, esquecia-se de que estava a ser filmada: "Ela tem um humor e um coração enormes. Pinta todos os dias e está muito mais bem-disposta do que antigamente".
 
"Não faço perguntas sobre os quadros. Ela acha difícil analisar as obras. Só fala da história do quadro. Mas se pergunto os porquês, os significados, ela não quer analisar, diz que não sabe, e que, se sabe, não pode pintar. Diz que pinta para descobrir porque está a pintar, e que, durante o ato de pintar, a vida dela muda, e a pintura também muda", descreveu.
 
Diz que a mãe é uma "story junkie" (viciada em histórias), transpostas para os seus quadros, através de bonecos e outras personagens, que Nick vê desde pequeno.
 
Paula Rego "teve uma vida bastante difícil, a lutar contra o governo do fascismo, a tentar ser pintora, sendo mulher nos anos 1960, quando a maioria dos artistas eram homens", acrescentou Willing, nas declarações aos jornalistas.
 
Nick Willing estima que o documentário esteja pronto dentro de um ano, que o irá mostrar primeiro à mãe e à família, "para obter aprovação", e só depois será exibido, em Portugal, no cinema.
 
A pintora, que completou em janeiro último 80 anos, não podia estar presente na conferência, mas o filho revelou um excerto muito pequeno do documentário, que mostra o ateliê, a mãe, roupas e figuras que usa para criar os quadros.
 
Paula Rego começou a desenhar ainda criança e partiu para a capital britânica com apenas 17 anos, para estudar na Slade School of Fine Art, onde iria a conhecer o futuro marido, o artista inglês Victor Willing, cuja obra Paula Rego já mostrou por várias vezes no museu Casa das Histórias, em Cascais, que detém um importante acervo de obras da autora.
 
Intitulada “Caught in the Act: the (Literary) Imagiconography of Paula Rego” ("Apanhado em flagrante: a 'imagiconografia' (literária) de Paula Rego"), a conferência internacional é organizada pelo Centre for English, Translation and Anglo-Portuguese Studies (CETAPS), unidade de Investigação da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH/NOVA).