Há 50 anos parecia impossível, hoje começa a tornar-se realidade. O fim da indústria pesada na margem sul do Tejo e o tratamento dos esgotos melhoraram a qualidade da água, e estão a transformar o estuário numa zona balnear.
Carla Graça, da associação ambientalista Quercus, estima, contudo, que será preciso, pelo menos, uma década até que as praias na margem Sul do estuário do Tejo - em Almada, no Seixal, no Barreiro, na Moita, no Montijo, em Alcochete - sejam uma realidade. E isso, alerta, acontecerá apenas se o ritmo atual de recuperação do estuário se mantiver.
Em última instância, tudo depende “do plano de desenvolvimento para a região nos próximos anos”. Nomeadamente, da decisão sobre a transferência do terminal de contentores de Lisboa para a Trafaria, em Almada, que “pode ter um grande impacto negativo na qualidade da água e de toda a zona balnear a sul do Tejo”.
E pode parar o caminho que trouxe o informático Artur Mendes, de 41 anos, a revisitar, com a filha, Ana, de cinco, memórias de infância na praia da Ponta dos Corvos, no concelho do Seixal, a primeira do estuário do Tejo a ser classificada pela Agência Portuguesa do Ambiente como zona balnear, em maio deste ano.
“Vim apresentar a praia à minha filha. Quando era mais novo, andei aqui uns anos a nadar. Depois, porque cresci, e devido à má qualidade da água, deixei de vir”, contou à Lusa.
A água do “mar da palha” que tinha na memória era mais suja do que aquela onde a pequena Ana molhou os pés, mesmo com a maré vazia, mas a areia, diz o pai, não está mais limpa. É preciso “melhorar a higiene, os apoios de praia – casas de banho, duches –, as acessibilidades e a segurança”. Esta não é uma praia vigiada.
As praias do estuário do Tejo, considera Carla Fonseca, “estão no bom caminho”, fizeram um progresso significativo com o fim das indústrias pesadas e com o tratamento dos esgotos nas duas margens do rio, mas estão “ainda bastante longe de uma bandeira azul”. Longe é o caminho entre uma água de qualidade “razoável” e “excelente”.
As autarquias “estão sensibilizadas para a valorização das frentes ribeirinhas”, mas a classificação que a Ponta dos Corvos recebeu quer apenas dizer que esta “é uma praia aconselhável em termos de qualidade da água”.
A partir daqui “há todo um conjunto de requisitos”, como “a qualidade das areias, das infraestruturas, ou o apoio salva-vidas”. Para além disso, “as pessoas decidem o que acham que é necessário para a sua prática balnear”, acrescentou.
Ou, no caso da família Viegas, fazem o que podem com o que têm. José, de 54 anos, e Filomena, de 52, estão desempregados e vivem no Laranjeiro, em Almada. São assíduos desta praia desde a infância. Aqui podem “fazer férias económicas”, explica a mulher.
“Temos o pinhal e água. Podemos trazer peixe para assar. Cozinha-se aqui e vai-se dormir a casa. Agora viemos de motorizada, mas pode vir-se a pé. É puxado mas faz-se bem”, contou à Lusa. A praia, disse, está melhor do que a dos seus tempos de garota, “sobretudo no que respeita a limpeza”. Filomena Viegas acrescentou que o espaço a convence também “porque não há dinheiro para ir para outros sítios”.
O marido, José, acha que a Praia dos Tesos, como a Ponta dos Corvos também é conhecida, tem melhores argumentos do que esse. Ele gosta de tudo aqui. Só lamenta a poeira do caminho e que não haja um nadador-salvador. Mas mesmo que não possa fazer-se nada em relação ao piso, em relação à vigilância os banhistas estão alerta e, garante, ajudam-se em situações de emergência.