“O futsal conseguiu tocar o céu”

“Eu sou apenas a cara deste grupo de trabalho”. As palavras de humildade de Ricardinho, perante as altas individualidades do Estado e o batalhão de jornalistas presentes no Palácio de Belém, entre os quais o JR, retratam a personalidade de um jogador de ‘palmo e meio’ de altura, com 1,64 metros, mas com uma alma enorme de campeão. Aos 32 anos, levou a modalidade “a tocar o céu”.
 
“Partimos de Rio Maior para a Eslovénia para tentar fazer história”, recordou o capitão da selecção que, a 10 de Fevereiro, conquistou um feito inédito para a modalidade e um dos poucos títulos que lhe faltava no currículo. Cinco vezes considerado como o melhor do mundo, Ricardinho, apelidado de ‘Mágico’ pelas jogadas fantásticas que levam ao rubro os adeptos, sentiu que os seus colegas lhe queriam oferecer esta conquista. Uma vitória memorável novamente num dia 10 e num jogo decisivo com outras particularidades parecidas com a final de 10 de Julho de 2016, em que a equipa das quinas, liderada por Fernando Santos, se tornou campeã da Europa de futebol, no Stade de France, em Paris. Nesse dia, tudo parecia condenado quando o melhor do mundo, CR7, se lesionou, mas Éder fez o impossível.
Desta vez, foi Ricardinho que se  lesionou, a poucos minutos do final da partida, já depois de Bruno Coelho também ficar condicionado. Mesmo limitado, o jogador do Benfica conseguiu fazer o 2-2, que levou o jogo para prolongamento e, no último minuto do tempo regulamentar, marcou o livre directo que levou ao rubro uma nação inteira. “Não é todos os dias que se vê onze milhões a festejar, e não é só em Portugal, é no mundo inteiro. Estou muito orgulhoso de ser português”, salientava Ricardinho, a antecipar os festejos com  que a selecção de futsal foi brindada à chegada a Portugal.
“Tinhamos um sonho, esse sonho tornou-se realidade. Dia 10 vai ficar para a história. O futsal conseguiu tocar o céu”, realçou o melhor do mundo, a jogar em Espanha, no Inter Movistar, que já brilhou no Benfica e disputou campeonatos como o japonês e o russo. “Estamos muito orgulhosos. Começámos lá debaixo e hoje somos os senhores do futsal”, reforçou Ricardinho, no discurso de agradecimento ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, pela recepção realizada logo após a chegada a Lisboa e ainda antes de depositar a taça na Cidade do Futebol, em Oeiras, ao lado dos troféus  do Euro 2016 e do Mundial de Futebol de Praia de 2015.
“Portugal já merecia um título assim, estivemos próximos na Hungria [em 2010], mas acho que a diferença para esta final foi que o espírito de grupo era totalmente diferente e conseguimos dar as mãos para ganhar este troféu”, confessou o capitão, na Cidade do Futebol, onde os jogadores, treinados por Jorge Braz, contaram os segredos desta caminhada de sucesso. “Nós temos um grupo no WhatsApp e o nome foi mudado para campeões europeus, ainda durante o estágio (Rio Maior), antes de chegarmos à Eslovénia”, revelou. Também após a sua lesão, “o Bruno Coelho, quando faltava um minuto e meio, disse-me: ‘Fica tranquilo que vamos ter um livre de 10 metros e eu vou meter a bola lá dentro’”. Bruno Coelho foi, aliás, um dos jogadores com mais premonições, já que, logo após o sorteio da fase final, enviou uma SMS ao seleccionador nacional e a colegas a dizer: “Vamos ser campeões!”.
Questionado pelo Jornal da Região se sentia que, aos 32 anos, esta era a derradeira oportunidade de conquistar o título europeu, Ricardinho respondeu, mais uma vez, com espírito de campeão: “Mesmo que eu não ganhasse agora, ganharíamos um dia e o importante é Portugal ganhar”.
O R10 realçou, aliás, que os seus companheiros “parecia que me queriam dar este troféu, pagar algo que não me devem”. A ambição, essa, fala mais alto e já pensa no Mundial de 2020. “Obviamente, somos ambiciosos. Temos aqui um grupo de jogadores jovens, alguns experientes, nunca velhos, e a Federação Portuguesa de Futebol está a fazer um trabalho fantástico, está a optar por criar o verdadeiro jogador português, com a base nos sub-18, sub-19 e sub-21”, recusando mesmo a naturalização de atletas estrangeiros.
Sobre o regresso à equipa espanhola que representa, não se mostrou preocupado: “já me tocou muitas vezes entrar cabisbaixo no balneário. Eu tinha dito que este era o ano de olhar lá de cima cá para baixo”. Para já, antes dos festejos em família em Valbom (Gondomar), que aconteceram poucas horas depois nesse domingo inesquecível, o ‘Mágico’ só pediu para o deixarem “estar neste barco a desfrutar com os meus companheiros porque custou muito e quero desfrutar destas águas”.
                      João Carlos Sebastião