Uma exposição com uma centena de obras de Paula Rego, inspiradas em fragmentos de peças de grandes mestres da pintura, em que a artista se retrata a si própria, é inaugurada na quinta-feira, em Cascais.
Intitulada "Caçadora Furtiva", a mostra, hoje apresentada aos jornalistas na Casa das Histórias Paula Rego, reúne 103 trabalhos em pintura, gravura e desenho, criados a partir dos anos 1990, inspirados em obras de grandes mestres da pintura de coleções britânicas.
O ponto de partida é a série de trabalhos da artista com origem numa estada de 18 meses na National Gallery, em Londres, depois de um convite para se instalar num atelier que ficava na cave do museu, para criar uma obra que resultasse da sua relação com a coleção.
Desse trabalho na National Gallery, na capital britânica, Paula Rego criou um mural de oito metros intitulado "O Jardim de Crivelli". O mural encontra-se na cafetaria da instituição fundada em 1824, que constitui um dos mais importantes museus europeus e um dos mais visitados em todo o mundo.
A galeria londrina acolhe uma coleção com mais de 2.000 pinturas criadas desde o século XIII até o início do século XX, com obras-primas de grandes mestres, como Leonardo da Vinci, Botticelli, Caravaggio, Rembrandt ou Rubens.
Paula Rego deu como título a esta exposição "Caçadora Furtiva", porque tem origem na recolha de impressões das obras que viu e que levava para a sua "toca", o atelier, como descreveu hoje Catarina Alfaro, curadora da mostra.
Entre as obras desta nova exposição está uma inédita em Portugal, intitulada "A Artista no seu Atelier", criada depois desta estada na galeria londrina, "em que a pintora portuguesa se retrata a si própria, inserida neste contexto exploratório do que é ser uma artista a relacionar-se com os grandes mestres da pintura antiga".
Na pintura, Paula Rego "surge rodeada de uma série de adereços simbólicos que vêm do atelier de artista, e ela própria assume uma postura bastante masculina, com um cachimbo, numa posição pouco comum às mulheres pintoras".
Catarina Alfaro explicou que, "no fundo, a obra reflete sobre a autorreferenciação da artista na História da Arte e nessa perceção do que é ser artista e ser mulher, e em que termos é necessário a uma mulher afirmar-se num mundo que tem mais artistas homens".
Todo o percurso de vida e criação artística de Paula Rego se reflete na obra da pintora, que, aos 17 anos, na década de 1960, foi estudar para Londres, pelas dificuldades de ser artista em Portugal.
"Foi o pai que a aconselhou a ir estudar em Londres, porque este país [Portugal] não era para mulheres", numa altura em que se vivia a ditadura de Oliveira Salazar.
Desde então que a obra da pintora ficou marcada por reflexões sobre temas sociais, sobretudo os relacionados com as mulheres, nomeadamente o aborto e os casamentos combinados.
Na mostra encontram-se obras importantes do percurso da pintora, desde os anos 1990, entre elas a série "Vanitas", criada para a Fundação Calouste Gulbenkian, "O Tempo passado e presente", "Mãe", "Anjo" e "Entre as Mulheres", provenientes de coleções britânicas e também portuguesas, como Serralves, além da coleção da Casa das Histórias.
Paula Rego, que reside em Londres, onde continua a pintar diariamente no seu ateliê, segundo o filho, Nick Willing, que virá a Cascais para a inauguração, em representação da mãe, atualmente com 80 anos.
A exposição "Caçadora Furtiva" vai ser inaugurada na quinta-feira, às 18:00, no âmbito da programação do Bairro dos Museus, e está prevista uma cerimónia de atribuição, ao auditório da Casa das Histórias Paula Rego, do nome de Maria de Jesus Barroso (1925-2015), que conta com a presença, segundo esta entidade, de Mário Soares e dos filhos, Isabel e João Soares, ministro da Cultura.